quarta-feira, 28 de maio de 2008

OBRIGAÇÃO DE FAZER E NÃO FAZER

CAPÍTULO IV: OBRIGAÇÕES DE FAZER E DE NÃO FAZER

1. Noção de obrigação de fazer

2. Diferença entre obrigação de fazer e de dar

3. Espécies de obrigação de fazer

3.1. Quanto à ação do devedor

3.1.1. de fato positivo

3.1.1.1. de fazer

3.1.2. de fato negativo

3.1.2.1. de não fazer

3.1.2.2. de tolerar

3.2. Quanto a natureza do fato:

3.2.1. de fato material

3.2.2. de fato jurídico

3.3. Quanto à possibilidade de a conduta ser prestada por terceiro

3.3.1. Pessoais ou infungíveis

3.3.2. Impessoais ou fungíveis

4. Princípios informadores

4.1. O princípio da intransmissibilidade dos atos intuito personae

4.2. O princípio da impossibilidade de inexecução parcial dos atos negativos

4.3. O princípio da necessidade da satisfação do interesse do credor

5. Inadimplemento das obrigações de fazer

5.1.1. Com base na teoria da culpa

5.1.1.1. Com culpa do devedor

5.1.1.1.1. Nas pessoais

a. extingue-se e perdas e danos

5.1.1.1.2. Nas impessoais

a. extingue-se com perdas e danos

b. manda executar por terceiro ou executa às custas do devedor cumulada com perdas e danos

c. obtém o resultado prático equivalente com perdas e danos

d. desfazer ou mandar desfazer à custa do devedor o que houvera sido feito

e. em todos os casos (b-c-d), aplicam-se as astreintes

5.1.1.2. Sem culpa do devedor

5.1.1.2.1. Nas pessoais: extingui-se

5.1.1.2.2. Nas impessoais: extingui-se

5.1.2. Com base na teoria do risco

5.1.2.1. A regra da última parte do § Único do art. 927 do CC 5.1.2.1.1. Pelo fato do serviço

5.1.2.1.2. Pelo vício do serviço

5. Orientação jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça

5.1. Astreintes e obrigação de fazer: [1]

É possível a fixação de multa diária por atraso na implantação de benefício previdenciário, em razão de tratar-se de obrigação de fazer. No caso, impôs-se à autarquia multa diária pelo descumprimento de não pagar valores definidos em execução, ou seja, obrigação de dar. Agravo conhecido e provido para afastar a multa.

5.2. Obrigação de fazer e astreintes: [2]

...............................................................................................................

3. A ausência de indicação do fundamento da violação do artigo de lei federal apontado como malferido revela a deficiência das razões do Recurso Especial, fazendo incidir a Súmula 284 do STF "É inadmissível o recurso extraordinário, quando a deficiência na sua fundamentação não permitir a exata compreensão da controvérsia."

4. Outrossim, a hipótese não retrata tutela antecipada; senão, incidente da execução quanto ao cumprimento do julgado, sendo certo que o juízo limitou-se a fixar as astreintes.

5. A função das astreintes é vencer a obstinação do devedor ao cumprimento da obrigação, e incide a partir da ciência do obrigado e da sua recalcitrância.

6. A valoração do quantum das astreintes revela-se matéria cujo conhecimento é inviável por esta Corte Superior, porquanto inequívoca operação de cunho fático, vedada à cognição do E. STJ (Súmula n.º 07).

7. A inclusão em folha de pagamento da pensão por morte devida aos dependentes de militar constitui-se em obrigação de fazer, posto referir-se à obrigações vincendas, inviáveis de serem cobradas incontinenti e, por isso, implicam em facere e não em obrigação de dar; mercê de o ordenamento já previr multa para obrigação de pagar quantia certa.

8. A Corte Superior, quanto à natureza jurídica da inclusão em folha de pagamento de pensão, no julgamento do RESP n.º 494.886/RS, da relatoria do e. Ministro José Arnaldo da Fonseca, publicado no DJ de 28.06.2004, assim se pronunciou: "PROCESSO CIVIL. EXECUÇÃO DE SENTENÇA. IMPLANTE DE PENSÃO. OBRIGAÇÃO DE FAZER. INOBSERVÂNCIA. ATO ATENTATÓRIO À DIGNIDADE DA JUSTIÇA. MULTA. A SANÇÃO PREVISTA NO ART. 601 DO CPC TEM SUPORTE EM ANÁLISE CIRCUNSTANCIAL. SÚMULA 7 DO STJ. MULTA DIÁRIA. POSSIBILIDADE. A multa prevista no art. 601 do Código de Processo Civil tem suporte em análise circunstancial vedada em Recurso Especial. O implante do pagamento de pensão constitui obrigação de fazer, possibilitando a cominação de astreintes por sua inobservância. Precedentes. Recurso parcialmente conhecido e, neste ponto, desprovido."

9. Recurso especial parcialmente conhecido, e, nesta parte, desprovido.

5.3. Distinção entre obrigação de dar e obrigação de fazer: [3]

...............................................................................................................

1. Determinando a sentença, nos termos do pedido, pura e simplesmente, o pagamento da indenização com o tratamento do segurado junto ao hospital em que esteve internado, não há como identificar obrigação de fazer capaz de autorizar a multa cominatória prevista no art. 461 do Código de Processo Civil.

2. Recurso especial conhecido e provido.

5.4. Obrigações de fazer fungíveis e infungíveis: [4]

PROCESSUAL CIVIL - COMINATORIA - OBRIGAÇÕES DE FAZER (FUNGIVEIS OU INFUNGIVEIS) - INTELIGENCIA DA NORMA DO ART. 287 DO CPC.

I - AS OBRIGAÇÕES DE FAZER INFUNGIVEIS TAMBEM SÃO OBJETO DE PEDIDO COMINATORIO, EIS QUE IRRELEVANTE SEJA O OBJETIVO DA PRESTAÇÃO FUNGIVEL, PORQUE TAMBEM O E NAS OBRIGAÇÕES DE DAR, QUANTO NAS DE FAZER. A PRESTAÇÃO, NO CASO DAS DE FAZER, REVELA-SE COMO UMA ATIVIDADE PESSOAL DO DEVEDOR, OBJETIVANDO APROVEITAR O SERVIÇO CONTRATADO.

II - RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

5.5. Obrigação de não fazer e direito difuso: [5]

DIREITO AMBIENTAL. LAVOURA DE CANA-DE-AÇÚCAR – QUEIMADAS. CÓDIGO FLORESTAL. ART. 27.

1. Tratando-se de atividade produtiva, mormente as oriundas dos setores primário e secundário, o legislador tem buscado, por meio da edição de leis e normas que possibilitem a viabilização do desenvolvimento sustentado, conciliar os interesses do segmento produtivo com os da população, que tem direito ao meio ambiente equilibrado.

2. Segundo a disposição do art. 27 da Lei n. 4.771/85, é proibido o uso de fogo nas florestas e nas demais formas de vegetação – as quais abrangem todas as espécies –, independentemente de serem culturas permanentes ou renováveis. Isso ainda vem corroborado no parágrafo único do mencionado artigo, que ressalva a possibilidade de se obter permissão do Poder Público para a prática de queimadas em atividades agropastoris, se as peculiaridades regionais assim indicarem.

3. Tendo sido realizadas queimadas de palhas de cana-de-açúcar sem a respectiva licença ambiental, e sendo certo que tais queimadas poluem a atmosfera terrestre, evidencia-se a ilicitude do ato, o que impõe a condenação à obrigação de não fazer, consubstanciada na abstenção de tal prática. Todavia, a condenação à indenização em espécie a ser revertida ao “Fundo Estadual para Reparação de Interesses Difusos” depende da efetiva comprovação do dano, mormente em situações como a verificada nos autos, em que a queimada foi realizada em apenas 5 hectares de terras, porção ínfima frente ao universo regional (Ribeirão Preto em São Paulo), onde as culturas são de inúmeros hectares a mais.

4. Recurso especial parcialmente provido.

5.6. Obrigação de não fazer, tutela antecipada e astreintes: [6]

PROCESSUAL CIVIL. VEDAÇÃO DE COBRANÇA DE LAUDÊMIO. ASTREINTES. OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER DE NATUREZA PERMANENTE; VALE DIZER, PASSÍVEL DE SER DESFEITA. INCIDÊNCIA DO MEIO DE COERÇÃO. TERMO A QUO. VIOLAÇÃO AO ART. 535, DO CPC. INOCORRÊNCIA.

1. Inexiste ofensa ao art. 535 do CPC, quando o Tribunal de origem, embora sucintamente, pronuncia-se de forma clara e suficiente sobre a questão posta nos autos. Ademais, o magistrado não está obrigado a rebater, um a um, os argumentos trazidos pela parte, desde que os fundamentos utilizados tenham sido suficientes para embasar a decisão.

2. Deferida a tutela antecipada da obrigação de não fazer de caráter permanente; isto é, passível de desfazimento, coadjuvada pela medida de coerção consistente nas astreintes, incidem estas desde o momento em que a parte é cientificada para não fazer, até o efetivo desfazimento.

3. A função das astreintes é vencer a obstinação do devedor ao cumprimento da obrigação, por isso do seu termo a quo ocorrer quando da ciência do obrigado e da sua recalcitrância.

4. Concedido o provimento liminar, é da ciência do mesmo que se caracteriza a resistência ao cumprimento do julgado, incidindo a multa até que se desfaça (facere) o que foi feito em transgressão ao preceito.

5. Decisão que determinou que a União se abstivesse de cobrar o laudêmio da parte autora datada de 24.01.2001 cujo descumprimento se deu em 29.05.2001, data em que a autora recebeu o aviso de cobrança e que consubstancia o termo a quo da incidência das astreintes.

6. Acórdão mantido ante à impossibilidade de reformatio in pejus.

7. Recurso especial desprovido.

5.7. Distinção entre cláusula penal e astreintes: [7]

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. CLÁUSULA PENAL E ASTREINTES. DISTINÇÃO. ART. 920, CC/1916. APLICAÇÃO NA EXECUÇÃO DE SENTENÇA. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA. RECURSO DESACOLHIDO.

I - Na linha da jurisprudência desta Corte, não se confunde a cláusula penal, instituto de direito material vinculado a um negócio jurídico, em que há acordo de vontades, com as astreintes, instrumento de direito processual, somente cabíveis na execução, que visa a compelir o devedor ao cumprimento de uma obrigação de fazer ou não fazer e que não correspondem a qualquer indenização por inadimplemento.

II - A regra da vedação do enriquecimento sem causa permite a aplicação do art. 920, CC/1916, nos embargos à execução de sentença transitada em julgado, para limitar a multa decendial ao montante da obrigação principal, sobretudo se o título exeqüendo não mencionou o período de incidência da multa.

III - Sendo o processo "instrumento ético de efetivação das garantias constitucionais" e instrumento de que se utiliza o Estado para fazer a entrega da prestação jurisdicional, não se pode utilizá-lo com fins de obter-se pretensão manifestamente abusiva, a enriquecer indevidamente o postulante.

5.8. Natureza da multa prevista no art. 465, do CPC: [8]

PROCESSUAL - MULTA - COMINAÇÃO - CPC, ART. 645 - INCIDÊNCIA - PRESSUPOSTO - DESOBEDIÊNCIA.

- A multa a que se refere o Art. 645 do CPC resulta de ameaça, lançada pelo juiz, para o caso de ser desobedecido o preceito judicial. Nada tem com a obrigação de indenizar.

- A desobediência é pressuposto de incidência de tal penalidade.

5.9. Direito ao nome comercial e obrigação de não fazer: [9]

Nome comercial. Marca. Exclusividade. Prescrição.

1. Na linha de precedentes da Corte, a proteção pura e simples ao uso do nome comercial ou marca tem prescrição vintenária, mas o ressarcimento do dano causado pelo uso indevido tem prescrição qüinqüenal, a contar da data em que se deu a ofensa ou o dano.

2. O nome comercial deve ser protegido, nos termos da Convenção de Paris, vigente no Brasil, até mesmo na ausência de qualquer registro.

3. A marca devidamente registrada deve ser protegida, não se podendo impedir o detentor do registro de usá-la com exclusividade.

4. Recurso conhecido e provido, em parte.

5.10. Obrigação de fato jurídico: [10]

Direito civil. Recurso especial. Processo de execução de obrigação de fazer. Compromisso de venda e compra. Anuência em escritura definitiva de venda e compra a ser celebrada com terceiro.

.........................................................................................................

- Celebrado o compromisso de compra e venda, ainda que não registrado, mas sem cláusula de direito de arrependimento e pago o preço dos imóveis pelo promissário-comprador, é cabível a tutela jurisdicional que tenha por escopo a pretensão executiva de suprir, por sentença, a anuência do promitente-vendedor em outorgar a escritura definitiva de compra e venda do imóvel.

- Se o promitente-vendedor não prometeu celebrar em seu nome o contrato definitivo de compra e venda, mas tão-somente apor anuência em escritura pública a ser outorgada por terceiro, desnecessária é a citação de sua mulher, que menos protegida estaria se citada fosse, hipótese em que poderia responder pelo descumprimento da obrigação de natureza pessoal assumida por seu cônjuge.

- Recurso especial a que não se conhece.

5.11. Obrigação de fato fungível: [11]

OBRIGAÇÃO DE FAZER. PRETENSÃO DE SE OBTER SENTENÇA, COM O MESMO EFEITO DO CONTRATO A SER FIRMADO. CONDIÇÃO SUSPENSIVA.

1. REALIZADA A CONDIÇÃO, TORNA-SE EXISTENTE O DIREITO, DAI, NO CASO, ERA POSSIVEL EXIGIR-SE O CUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO.

2. IMPROCEDENCIA DA ALEGAÇÃO DE INCOMPETENCIA DO FORO POR ONDE ANDOU A DEMANDA, PORQUANTO FOI ELA PROPOSTA NO FORO DO DOMICILIO DOS REUS. DE OUTRA PARTE, PORQUE NÃO SE TRATAVA DE AÇÃO VERSANDO PROPRIEDADE OU POSSE.

3. INOCORRENCIA DE JULGAMENTO CITRA PETITA. 4. ESPECIE EM QUE O ACORDÃO ESTADUAL NÃO OFENDEU A LEI FEDERAL, POR ISSO A TURMA NÃO CONHECEU DOS RECURSOS ESPECIAIS.

5.12. Obrigação de fato fungível e efeitos de sua inexecução: [12]

ADMINISTRATIVO - ATRASO NA DEMOLIÇÃO DE OBRA NÃO AUTORIZADA - COMINAÇÃO DE PENA.

- Em sendo obrigação fungível, o desfazimento da obra poderia ser realizado tanto pelo ente público, como pelo próprio condomínio-réu, ou por terceiro. E, à custa do condomínio-réu, nenhum ônus o fato da demolição estaria causando aos cofres públicos.

- Recurso desprovido.

5.13. Obrigação infungível e morte do devedor: [13]

RECURSO ESPECIAL. LOCAÇÃO. FIANÇA. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA. MORTE DO LOCATÁRIO. EXTINÇÃO DO CONTRATO.

1. O contrato de fiança deve ser interpretado restritivamente, não vinculando o fiador a prorrogação do pacto locatício sem sua expressa anuência, ainda que haja cláusula prevendo sua responsabilidade até a entrega das chaves.

2. Ressalva do ponto de vista do relator.

3. Por ser contrato de natureza intuitu personae, a morte do locatário importa em extinção da fiança e exoneração da obrigação do fiador.

4. Recurso provido.



[1] AgRg no REsp 644.488/MG, Rel. Ministro JOSÉ ARNALDO DA FONSECA.

[2] REsp 638.806/RS, Rel. Ministro LUIZ FUX.

[3] REsp 469.659/RS, Rel. Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO.

[4] REsp 6.314/RJ, Rel. Ministro WALDEMAR ZVEITER.

[5] REsp 439.456/SP, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA.

[6] REsp 518.155/RS, Rel. Ministro LUIZ FUX.

[7] REsp 422.966/SP, Rel. Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA.

[8] REsp 351.474/SP, Rel. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS.

[9] REsp 40.021/SP, Rel. Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO.

[10] REsp 424.543/ES, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI.

[11] REsp 32.795/GO, Rel. Ministro NILSON NAVES.

[12] REsp 138338 / RJ ; Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS.

[13] REsp 555615/RS, Rel. Ministro PAULO GALLOTTI.

segunda-feira, 26 de maio de 2008

OBRIGAÇÃO DE DAR COISA INCERTA

OBRIGAÇÃO DE DAR COISA INCERTA

1. Configuração da coisa incerta

1.1. Noção de coisa incerta

1.2. Exemplos

1.3. Distinções necessárias

1.3.1. Entre obrigação genérica e obrigação de dar coisa fungível

1.3.2. Entre obrigação genérica e obrigação alternativa:

1.3.3. Entre prestação genérica e prestação fungível:

1.4. Princípios informadores: “o gênero não perece” e “o credor de coisa certa não está obrigado a receber coisa diferente”

2. A concentração do débito

2.1. Colocação do problema

2.2. Noção

2.3. Classificação

2.3.1. Convencional

2.3.2. Legal

2.3.3. Natural

2.3.4. Judicial

2.4. Natureza jurídica

2.5. A quem compete a escolha

2.6. Regras aplicáveis

2.6.1. No Código Civil (243 a 246)

2.6.2. No Código de Processo Civil (629 a 631)

2.6.2.1. Escolha do devedor

2.6.2.2. Escolha do credor

3. Orientação jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça

3.1. Obrigação de dar coisa incerta: [1]

I - A execução para entrega de coisa incerta, após a escolha do bem, segue o rito previsto para a execução de coisa certa(arts. 621 e segs.).

II - O objetivo específico da execução para entrega da coisa é a obtenção do bem que se encontra no patrimônio do devedor (ou de terceiro). Caso não mais seja encontrado o bem, ou no caso de destruição ou alienação, poderá o credor optar pela entrega de quantia em dinheiro equivalente ao valor da coisa e postular a transformação da execução de coisa certa em execução por quantia certa, na linha do art. 627, CPC.

III - Indispensável, nessa hipótese, contudo, a prévia apuração do quantum, por estimativa do credor ou por arbitramento. Sem essa liquidação, fica inviável a conversão automática da execução para entrega da coisa em execução por quantia certa, mormente pelo fato que a execução carecerá de pressuposto específico, a saber, a liquidez.

3.2. Obrigação de dar coisa incerta: [2]

Trata-se de agravo de instrumento interposto contra decisão denegatória de seguimento a recurso especial fundado na alínea "a" do permissivo constitucional, em que se alega ofensa aos artigos 36 da Lei n.º 6.404/76; 50 e 1.069 do Código Civil.

Insurge-se contra acórdão assim ementado (fl. 143): "AÇÃO COMINATÓRIA. Cumprimento de obrigação de entrega de laranjas para produção de suco. Empresa industrial de que participa o réu na condição de acionista. Tutela antecipada concedida.

Inadmissibilidade. Direito subjetivo não aparente. Obrigação de dar coisas incertas ou infungíveis. Alienação já consumada, ademais, da posição contratual na venda e compra e de ações da companhia.

Negócios jurídicos não subordinados à venda conjunta do imóvel onde os cedentes cultivam as frutas. Provimento ao recurso. Não incidência do art. 461, § 3º, do CPC. Voto vencido. Não é caso de tutela provisória, ou antecipada, em ação cominatória, na qual companhia exige de acionista, que já cedeu ações e a posição contratual em venda e compra de frutas, a entrega destas, sob fundamento de que as cessões estariam subordinadas à venda conjunta do imóvel onde as cultiva." Sustenta a empresa recorrente que não é possível ao acionista-vendedor ceder o contrato de compra e venda de frutas a terceiro sem a sua anuência e, ainda, que é lícito, por avença, emprestar caráter de infungibilidade a determinados bens fungíveis.

Inviável, porém, o recurso.

A pretensão recursal demanda interpretação de cláusulas do contrato entabulado entre as partes e reexame do conteúdo probatório coligido aos autos, o que é vedado pelas Súmulas 5 e 7 desta Corte.

Ante o exposto, nego provimento ao agravo de instrumento.

3.3. Venda de coisa futura: [3]

PROCESSO CIVIL. EXECUÇÃO PARA ENTREGA DE COISA FUNGÍVEL EM DATA CERTA E FUTURA. SACAS DE CAFÉ. VENCIMENTO DA DÍVIDA. TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL. ARTS. 585, II, E 621, CPC. RECURSO PROVIDO.

I - A redação dada aos arts. 585, II, e 621, CPC, pela Lei 8.953/94, ampliou o rol dos títulos executivos, extrajudiciais.

II - Admissível perante o nosso direito a execução fundada em contrato que registre a obrigação de entregar coisa fungível, em data determinada, sem necessidade de prévio processo de conhecimento, bastando que o instrumento contenha os requisitos da exigibilidade, certeza e liquidez, sendo que, no ponto, tal possibilidade já era possível antes mesmo da "Reforma" em curso (precedente: REsp 52.052-RS).

III - O acórdão que examina todos os pontos suscitados, sem incorrer nos vícios de omissão, contradição e obscuridade, não viola o art. 535, CPC.



[1] REsp 327.650/MS, Rel. Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, QUARTA TURMA, julgado em 26.08.2003, DJ 06.10.2003 p. 273

[2] AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 517.356 – SP, Rel. MINISTRO ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO

[3] REsp 188.328/ES, Rel. Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, QUARTA TURMA, julgado em 15.02.2000, DJ 27.03.2000 p. 110

DANO MORAL - ABANDONO EFETIVO - RESP 757.411 -

Superior Tribunal de Justiça
Revista Eletrônica de Jurisprudência
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RECURSO ESPECIAL Nº 757.411 - MG (2005⁄0085464-3)
RELATOR : MINISTRO FERNANDO GONÇALVES
RECORRENTE : V DE P F DE O F
ADVOGADO : JOÃO BOSCO KUMAIRA E OUTROS
RECORRIDO : A B F (MENOR)
ASSIST POR : V B F
ADVOGADO : RODRIGO DA CUNHA PEREIRA E OUTROS

EMENTA

RESPONSABILIDADE CIVIL. ABANDONO MORAL. REPARAÇÃO. DANOS MORAIS. IMPOSSIBILIDADE.
1. A indenização por dano moral pressupõe a prática de ato ilícito, não rendendo ensejo à aplicabilidade da norma do art. 159 do Código Civil de 1916 o abandono afetivo, incapaz de reparação pecuniária.
2. Recurso especial conhecido e provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por maioria, conhecer do recurso e lhe dar provimento. Votou vencido o Ministro Barros Monteiro, que dele não conhecia. Os Ministros Aldir Passarinho Junior, Jorge Scartezzini e Cesar Asfor Rocha votaram com o Ministro Relator.

Brasília, 29 de novembro de 2005 (data de julgamento).

MINISTRO FERNANDO GONÇALVES, Relator
RECURSO ESPECIAL Nº 757.411 - MG (2005⁄0085464-3)

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO FERNANDO GONÇALVES:

Por ALEXANDRE BATISTA FORTES foi proposta ação ordinária contra VICENTE DE PAULO FERRO DE OLIVEIRA, seu pai, pleiteando indenização por danos morais decorrentes do abandono afetivo por ele perpetrado.
Sustenta o autor, nascido em março de 1981, que desde o divórcio de seus pais em 1987, época do nascimento da filha do recorrente com sua segunda esposa, por ele foi descurado o dever de lhe prestar assistência psíquica e moral, evitando-lhe o contato, apesar de cumprir a obrigação alimentar. Aduz não ter tido oportunidade de conhecer e conviver com a meia-irmã, além de ignoradas todas as tentativas de aproximação do pai, quer por seu não comparecimento em ocasiões importantes, quer por sua atitude displicente, situação causadora de extremo sofrimento e humilhação, restando caracterizada a conduta omissa culposa a ensejar reparação.
O genitor, a seu turno, esclarece ser a demanda resultado do inconformismo da mãe do recorrente com a propositura de ação revisional de alimentos, na qual pretende a redução da verba alimentar. Aduz ter até maio de 1989 visitado regularmente o filho, trazendo-o em sua companhia nos finais de semana, momento em que as atitudes de sua mãe, com telefonemas insultuosos e instruções ao filho para agredir a meio-irmã, tornaram a situação doméstica durante o convívio quinzenal insuportável. Relata, além disso, ter empreendido diversas viagens, tanto pelo Brasil, quanto para o exterior, permanecendo atualmente na África do Sul, comprometendo ainda mais a regularidade dos encontros. Salienta que, conquanto não tenha participado da formatura do filho ou de sua aprovação no vestibular, sempre demonstrou incentivo e júbilo por telefone. Afirma, nesse passo, não ter ocorrido qualquer ato ilícito.
Em primeira instância (fls. 81⁄83), o Juiz de Direito da 19ª Vara Cível da Comarca de Belo Horizonte - MG julga improcedente o pedido inicial, salientando:
"... não haver estabelecido o laudo psicológico exata correlação entre o afastamento paterno e o desenvolvimento de sintomas psicopatológicos pelo autor, não tendo detectado o expert sinais de comprometimento psicológico ou qualquer sintomatologia associada a eventual malogro do laço paterno filial (fls. 71).
A par de tais conclusões periciais resta inequívoco que, não obstante a relutância paterna em empreender visitações ao filho afete-lhe negativamente o estado anímico, tal circunstância não se afigura suficientemente penosa, a ponto de comprometer-lhe o desempenho de atividades curriculares e profissionais, estando o autor plenamente adaptado à companhia da mãe e de sua bisavó.
De sua vez, indica o estudo social o sentimento de indignação do autor ante o tentame paterno de redução do pensionamento alimentício, estando a refletir, tal quadro circunstancial, propósito pecuniário incompatível às motivações psíquicas noticiadas na Inicial (fls. 74).
Por outro lado, não se colhe do conjunto probatório descaso intencional do réu para com a criação, educação e a formação da personalidade do filho, de molde a caracterizar o estado de abandono a que se refere o art. 395, II, do Cód. Civil, a determinar, inclusive, a perda do pátrio-poder.
(...)
Tais elementos fático-jurídicos conduzem à ilação pela qual o tormento experimentado pelo autor tem por nascedouro e vertedouro o traumático processo de separação judicial vivenciado por seus pais, inscrevendo-se o sentimento de angústia dentre os consectários de tal embate emocional, donde inviável inculpar-se exclusivamente o réu por todas as idiossincrasias pessoais supervenientes ao crepúsculo da paixão."
Interposta apelação, a Sétima Câmara Cível do Tribunal de Alçada do Estado de Minas Gerais dá provimento ao recurso para condenar o recorrente ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 44.000,00 (quarenta e quatro mil reais), entendendo configurado nos autos o dano sofrido pelo autor em sua dignidade, bem como a conduta ilícita do genitor, ao deixar de cumprir seu dever familiar de convívio com o filho e com ele formar laços de paternidade.
A ementa está assim redigida:
"INDENIZAÇÃO DANOS MORAIS - RELAÇÃO PATERNO-FILIAL - PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA - PRINCÍPIO DA AFETIVIDADE.
A dor sofrida pelo filho, em virtude do abandono paterno, que o privou do direito à convivência, ao amparo afetivo, moral e psíquico, deve ser indenizável, com fulcro no princípio da dignidade da pessoa humana." (fls. 125)
Perante esta Corte VICENTE DE PAULO FERRO DE OLIVEIRA interpõe recurso especial com fundamento nas alíneas "a" e "c" do permissivo constitucional, sustentando violação ao art. 159 do Código Civil de 1916 e dissídio jurisprudencial. Aduz não estarem presentes na hipótese os elementos constitutivos do ato ilícito de modo a embasar uma condenação. Afirma que as dificuldades oriundas de uma separação e da atividade profissional do pai são fatos normais da vida, não havendo que se falar em dolo ou culpa.
Foram apresentadas contra-razões (fls. 149⁄163). Salienta o recorrido não prescindir o exame do especial do reexame do material fático-probatório, além de não restar caracterizado o dissídio jurisprudencial, dada a ausência de casos semelhantes na jurisprudência nacional a ensejar o confronto analítico. Afirma ser irretocável a decisão objeto do recurso.
Ascenderam os autos a este Superior Tribunal de Justiça, por força de provimento a agravo regimental.
Parecer da Subprocuradoria-Geral da República pelo não conhecimento do recurso e, acaso conhecido, pelo não provimento (fls. 176⁄179). São os termos da ementa:
"RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. DANO MORAL. ABANDONO AFETIVO. DESCUMPRIMENTO DE DEVERES PATERNOS. PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. PRINCÍPIO DA AFETIVIDADE. ÓBICE DA SÚMULA 07 DO STJ. COMPROVAÇÃO DO DANO EMOCIONAL E PSÍQUICO SOFRIDO PELO FILHO.

Pelo não conhecimento, e se conhecido, pelo não provimento."

É o relatório.
RECURSO ESPECIAL Nº 757.411 - MG (2005⁄0085464-3)

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO FERNANDO GONÇALVES (RELATOR):

A questão da indenização por abandono moral é nova no Direito Brasileiro. Há notícia de três ações envolvendo o tema, uma do Rio Grande do Sul, outra de São Paulo e a presente, oriunda de Minas Gerais, a primeira a chegar ao conhecimento desta Corte.
A demanda processada na Comarca de Capão da Canoa-RS foi julgada procedente, tendo sido o pai condenado, por abandono moral e afetivo da filha de nove anos, ao pagamento de indenização no valor correspondente a duzentos salários mínimos. A sentença, proferida em agosto de 2003, teve trânsito em julgado, vez que não houve recurso do réu, revel na ação. Cumpre ressaltar que a representante do Ministério Público que teve atuação no caso entendeu que "não cabe ao Judiciário condenar alguém ao pagamento de indenização por desamor", salientando não poder ser a questão resolvida com base na reparação financeira.
O Juízo da 31ª Vara Cível do Foro Central de São Paulo-SP, a seu turno, condenou um pai a indenizar sua filha, reconhecendo que, conquanto fuja à razoabilidade que um filho ingresse com ação contra seu pai, por não ter dele recebido afeto, "a paternidade não gera apenas deveres de assistência material, e que além da guarda, portanto independentemente dela, existe um dever, a cargo do pai, de ter o filho em sua companhia".
A matéria é polêmica e alcançar-se uma solução não prescinde do enfrentamento de um dos problemas mais instigantes da responsabilidade civil, qual seja, determinar quais danos extrapatrimoniais, dentre aqueles que ocorrem ordinariamente, são passíveis de reparação pecuniária. Isso porque a noção do que seja dano se altera com a dinâmica social, sendo ampliado a cada dia o conjunto dos eventos cuja repercussão é tirada daquilo que se considera inerente à existência humana e transferida ao autor do fato. Assim situações anteriormente tidas como "fatos da vida", hoje são tratadas como danos que merecem a atenção do Poder Judiciário, a exemplo do dano à imagem e à intimidade da pessoa.
Os que defendem a inclusão do abandono moral como dano indenizável reconhecem ser impossível compelir alguém a amar, mas afirmam que "a indenização conferida nesse contexto não tem a finalidade de compelir o pai ao cumprimento de seus deveres, mas atende duas relevantes funções, além da compensatória: a punitiva e a dissuasória. (Indenização por Abandono Afetivo, Luiz Felipe Brasil Santos, in ADV - Seleções Jurídicas, fevereiro de 2005).
Nesse sentido, também as palavras da advogada Cláudia Maria da Silva: "Não se trata, pois, de "dar preço ao amor" – como defendem os que resistem ao tema em foco - , tampouco de "compensar a dor" propriamente dita. Talvez o aspecto mais relevante seja alcançar a função punitiva e dissuasória da reparação dos danos, conscientizando o pai do gravame causado ao filho e sinalizando para ele, e outros que sua conduta deve ser cessada e evitada, por reprovável e grave.” ( Descumprimento do Dever de Convivência Familiar e Indenização por Danos á Personalidade do Filho, in Revista Brasileira de Direito de Família, Ano VI, n° 25 – Ago-Set 2004)
No caso de abandono ou do descumprimento injustificado do dever de sustento, guarda e educação dos filhos, porém, a legislação prevê como punição a perda do poder familiar, antigo pátrio-poder, tanto no Estatuto da Criança e do Adolescente, art. 24, quanto no Código Civil, art. 1638, inciso II. Assim, o ordenamento jurídico, com a determinação da perda do poder familiar, a mais grave pena civil a ser imputada a um pai, já se encarrega da função punitiva e, principalmente, dissuasória, mostrando eficientemente aos indivíduos que o Direito e a sociedade não se compadecem com a conduta do abandono, com o que cai por terra a justificativa mais pungente dos que defendem a indenização pelo abandono moral.
Por outro lado, é preciso levar em conta que, muitas vezes, aquele que fica com a guarda isolada da criança transfere a ela os sentimentos de ódio e vingança nutridos contra o ex-companheiro, sem olvidar ainda a questão de que a indenização pode não atender exatamente o sofrimento do menor, mas também a ambição financeira daquele que foi preterido no relacionamento amoroso.
No caso em análise, o magistrado de primeira instância alerta, verbis:
"De sua vez, indica o estudo social o sentimento de indignação do autor ante o tentame paterno de redução do pensionamento alimentício, estando a refletir, tal quadro circunstancial, propósito pecuniário incompatível às motivações psíquicas noticiadas na Inicial (fls. 74)
(...)

Tais elementos fático-probatórios conduzem à ilação pela qual o tormento experimentado pelo autor tem por nascedouro e vertedouro o traumático processo de separação judicial vivenciado por seus pais, inscrevendo-se o sentimento de angústia dentre os consectários de tal embate emocional, donde inviável inculpar-se exclusivamente o réu por todas as idiossincrasias pessoais supervenientes ao crepúsculo da paixão." (fls. 83)

Ainda outro questionamento deve ser enfrentado. O pai, após condenado a indenizar o filho por não lhe ter atendido às necessidades de afeto, encontrará ambiente para reconstruir o relacionamento ou, ao contrário, se verá definitivamente afastado daquele pela barreira erguida durante o processo litigioso?

Quem sabe admitindo a indenização por abandono moral não estaremos enterrando em definitivo a possibilidade de um pai, seja no presente, seja perto da velhice, buscar o amparo do amor dos filhos, valendo transcrever trecho do conto "Para o aniversário de um pai muito ausente", a título de reflexão (Colocando o "I" no pingo... E Outras Idéias Jurídicas e Sociais, Jayme Vita Roso, RG Editores, 2005):

"O Corriere della Sera, famoso matutino italiano, na coluna de Paolo Mieli, que estampa cartas selecionadas dos leitores, de tempos em tempos alguma respondida por ele, no dia 15 de junho de 2002, publicou uma, escrita por uma senhora da cidade de Bari, com o título "Votos da filha, pelo aniversário do pai".
Narra Glória Smaldini, como se apresentou a remetente, e escreve: "Caro Mieli, hoje meu pai faz 67 anos. Separou-nos a vida e, no meu coração, vivo uma relação conflitual, porque me considero sua filha ´não aproveitada´. Aos três anos fui levada a um colégio interno, onde permaneci até a maioridade. Meu pai deixara minha mãe para tornar a se casar com uma senhora. Não conheço seus dois outros filhos, porque, no dizer dele, a segunda mulher ´não quer misturar as famílias´.

Faz 30 anos que nos relacionamos à distância, vemo-nos esporadicamente e presumo que isso ocorra sem que saiba a segunda mulher. Esperava que a velhice lhe trouxesse sabedoria e bom senso, dissipando antigos rancores. Hoje, aos 39 anos, encontro-me ainda a esperar. Como meu pai é leitor do Corriere, peço-lhe abrigar em suas páginas meus cumprimentos para meu pai que não aproveitei."

Por certo um litígio entre as partes reduziria drasticamente a esperança do filho de se ver acolhido, ainda que tardiamente, pelo amor paterno. O deferimento do pedido, não atenderia, ainda, o objetivo de reparação financeira, porquanto o amparo nesse sentido já é providenciado com a pensão alimentícia, nem mesmo alcançaria efeito punitivo e dissuasório, porquanto já obtidos com outros meios previstos na legislação civil, conforme acima esclarecido.
Desta feita, como escapa ao arbítrio do Judiciário obrigar alguém a amar, ou a manter um relacionamento afetivo, nenhuma finalidade positiva seria alcançada com a indenização pleiteada.
Nesse contexto, inexistindo a possibilidade de reparação a que alude o art. 159 do Código Civil de 1916, não há como reconhecer o abandono afetivo como dano passível de indenização.
Diante do exposto, conheço do recurso e lhe dou provimento para afastar a possibilidade de indenização nos casos de abandono moral.
RECURSO ESPECIAL Nº 757.411 - MG (2005⁄0085464-3)
VOTO
EXMO. SR. MINISTRO ALDIR PASSARINHO JUNIOR: Sr. Presidente, estou inteiramente de acordo com o voto de V. Exa. Entendo que essa questão - embora dolorosa nas relações entre pais e filhos, marido e mulher, nas relações de família em geral - resolve-se no campo do Direito de Família, exclusivamente. No caso, existe previsão no art. 384, inciso I, quanto à obrigação dos pais de dirigir a criação e a educação dos filhos e tê-los em sua guarda e companhia. Mas os arts. 394 e 395 prevêem exatamente a situação em que, não cumprindo os pais essa obrigação, poderá ocorrer a perda do pátrio poder a pedido do Ministério Público ou de algum parente.

Diz o art. 395:

" Perderá, por ato judicial, o pátrio poder o pai ou mãe que deixar o filho ao abandono."

Não me parece que isso tenha sido requerido nem pelo Ministério Público nem por algum parente, notadamente a mãe, em nome de quem ele estava sob a guarda direta, porque, aparentemente, o pai se ausentou.

Na hipótese de perda do pátrio poder, a tutela é dada em substituição, nos termos do art. 406, I, também do Código Civil anterior. Parece-me, pois, que não é hipótese de ato ilícito. Não é dessa forma que se enfrentaria tal situação. A legislação de família prevê institutos específicos, inclusive em relação às necessidades do filho na lei de alimentos. Aqui, ressalto, foram prestados os alimentos.

Com essas considerações apenas adicionais, acompanho o voto de V. Exa. no sentido de conhecer do recurso especial e dar-lhe provimento para julgar improcedente a ação.

RECURSO ESPECIAL Nº 757.411 - MG (2005⁄0085464-3)
VOTO-VENCIDO
O SR. MINISTRO BARROS MONTEIRO:
Sr. Presidente, rogo vênia para dissentir do entendimento manifestado por V. Exa. e pelos eminentes Ministros Aldir Passarinho Junior e Jorge Scartezzini.
O Tribunal de Alçada de Minas Gerais condenou o réu a pagar 44 mil reais por entender configurado nos autos o dano sofrido pelo autor em sua dignidade, bem como por reconhecer a conduta ilícita do genitor ao deixar de cumprir seu dever familiar de convívio e afeto com o filho, deixando assim de preservar os laços da paternidade. Esses fatos são incontroversos. Penso que daí decorre uma conduta ilícita da parte do genitor que, ao lado do dever de assistência material, tem o dever de dar assistência moral ao filho, de conviver com ele, de acompanhá-lo e de dar-lhe o necessário afeto.
Como se sabe, na norma do art. 159 do Código Civil de 1916, está subentendido o prejuízo de cunho moral, que agora está explícito no Código novo. Leio o art. 186:
"Aquele que por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito ou causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito."
Creio que é essa a hipótese dos autos. Haveria, sim, uma excludente de responsabilidade se o réu, no caso o progenitor, demonstrasse a ocorrência de força maior, o que me parece não ter sequer sido cogitado no acórdão recorrido. De maneira que, no caso, ocorreram a conduta ilícita, o dano e o nexo de causalidade. O dano resta evidenciado com o sofrimento, com a dor, com o abalo psíquico sofrido pelo autor durante todo esse tempo.
Considero, pois, ser devida a indenização por dano moral no caso, sem cogitar de, eventualmente, ajustar ou não o quantum devido, porque me parece que esse aspecto não é objeto do recurso.
Penso também, que a destituição do poder familiar, que é uma sanção do Direito de Família, não interfere na indenização por dano moral, ou seja, a indenização é devida além dessa outra sanção prevista não só no Estatuto da Criança e do Adolescente, como também no Código Civil anterior e no atual.
Por essas razões, rogando vênia mais uma vez, não conheço do recurso especial.
RECURSO ESPECIAL Nº 757.411 - MG (2005⁄0085464-3)
VOTO
O SR. MINISTRO CESAR ASFOR ROCHA: Sr. Presidente, é certo que o Tribunal de Justiça de Minas Gerais pontificou que o recorrido teria sofrido em virtude do abandono paterno; são fatos que não podem ser desconstituídos. E é justamente com base nesses fatos que aprecio o que está ora posto. Penso que o Direito de Família tem princípios próprios que não podem receber influências de outros princípios que são atinentes exclusivamente ou – no mínimo – mais fortemente - a outras ramificações do Direito. Esses princípios do Direito de Família não permitem que as relações familiares, sobretudo aquelas atinentes a pai e filho, mesmo aquelas referentes a patrimônio, a bens e responsabilidades materiais, a ressarcimento, a tudo quanto disser respeito a pecúnia, sejam disciplinadas pelos princípios próprios do Direito das Obrigações. Destarte, tudo quanto disser respeito às relações patrimoniais e aos efeitos patrimoniais das relações existentes entre parentes e entre os cônjuges só podem ser analisadas e apreciadas à luz do que está posto no próprio Direito de Família. Essa compreensão decorre da importância que tem a família, que é alçada à elevada proteção constitucional como nenhuma outra entidade vem a receber, dada a importância que tem a família na formação do próprio Estado. Os seus valores são e devem receber proteção muito além da que o Direito oferece a qualquer bem material. Por isso é que, por mais sofrida que tenha sido a dor suportada pelo filho, por mais reprovável que possa ser o abandono praticado pelo pai – o que, diga-se de passagem, o caso não configura - a repercussão que o pai possa vir a sofrer, na área do Direito Civil, no campo material, há de ser unicamente referente a alimentos; e, no campo extrapatrimonial, a destituição do pátrio poder, no máximo isso. Com a devida vênia, não posso, até repudio essa tentativa, querer quantificar o preço do amor. Ao ser permitido isso, com o devido respeito, iremos estabelecer gradações para cada gesto que pudesse importar em desamor: se abandono por uma semana, o valor da indenização seria "x"; se abandono por um mês, o valor da indenização seria "y", e assim por diante. Com esses fundamentos, e acostando-me ao que foi posto pelo eminente Ministro Fernando Gonçalves, Relator deste feito, e pelos Srs. Ministros Aldir Passarinho Junior e Jorge Scartezzinni, peço vênia ao eminente Sr. Ministro Barros Monteiro para conhecer do recurso especial e dar-lhe provimento.
CERTIDÃO DE JULGAMENTO
QUARTA TURMA
Número Registro: 2005⁄0085464-3 REsp 757411 ⁄ MG
Números Origem: 20000624650 200401427225 4085505 633801
PAUTA: 22⁄11⁄2005 JULGADO: 29⁄11⁄2005
Relator
Exmo. Sr. Ministro FERNANDO GONÇALVES
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro FERNANDO GONÇALVES
Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. DURVAL TADEU GUIMARÃES
Secretária
Bela. CLAUDIA AUSTREGÉSILO DE ATHAYDE BECK
AUTUAÇÃO
RECORRENTE : V DE P F DE O F
ADVOGADO : JOÃO BOSCO KUMAIRA E OUTROS
RECORRIDO : A B F (MENOR)
ASSIST POR : V B F
ADVOGADO : RODRIGO DA CUNHA PEREIRA E OUTROS
ASSUNTO: Civil - Responsabilidade Civil - Indenização - Ato Ilícito - Dano Moral
SUSTENTAÇÃO ORAL
DR. JOÃO BOSCO KUMAIRA, pelo Recorrente.
DR. RODRIGO DA CUNHA PEREIRA, pelo recorrido.
CERTIDÃO
Certifico que a egrégia QUARTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A Turma, por maioria, conheceu do recurso e deu-lhe provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Votou vencido o Sr. Ministro Barros Monteiro, que dele não conhecia.
Os Srs. Ministros Aldir Passarinho Junior, Jorge Scartezzini e Cesar Asfor Rocha votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília, 29 de novembro de 2005
CLAUDIA AUSTREGÉSILO DE ATHAYDE BECK
Secretária

Documento: 595269Inteiro Teor do Acórdão- DJ: 27/03/2006

sábado, 17 de maio de 2008

T2-C2 - OBRIGAÇÃO DE DAR COISA CERTA

CAPÍTULO II: OBRIGAÇÕES DE DAR COISA CERTA

1. Generalidades

2. Prestação de coisa e prestação de fato

2.1. Noção

2.1.1. Prestação de coisa

2.1.2. Prestação de fato

2.2. Exemplos

2.2.1. Prestação de coisa

2.2.2. Prestação de fato

2.3. Critérios de distinção

2.3.1. Critério econômico

2.3.2. Critério jurídico

3. Classificação da obrigação de dar coisa certa

3.1. Quanto ao direito a ser transferido (propriedade e/ou outro direito sobre a coisa)

3.1.1. Obrigação de dar em sentido estrito

3.1.1.1. Noção

3.1.1.2. Exemplo

3.1.2. Obrigação de entregar

3.1.2.1. Noção

3.1.2.2. Exemplo

3.1.3. Obrigação de recuperar ou restituir

3.1.3.1. Noção

3.1.3.2. Exemplo

3.2. Quanto ao grau de individuação da coisa

3.2.1. Obrigação de dar coisa certa

3.2.1.1. Noção

3.2.1.2. Exemplo

3.2.2. Obrigação de dar coisa incerta

3.2.2.1. Noção

3.2.2.2. Exemplo

3.3. Quanto à existência da coisa no instante da constituição do vínculo

3.3.1. Obrigação de dar coisa presente

3.3.1.1. Noção

3.3.1.2. Exemplo

3.3.2. Obrigação de dar coisa futura

3.3.2.1. Noção

3.3.2.2. Exemplo

3.4. Quanto à titularidade da coisa

3.4.1. Obrigação de dar coisa própria

3.4.1.1. Noção

3.4.1.2. Exemplo

3.4.2. Obrigação de dar coisa alheia

3.4.2.1. Noção

3.4.2.2. Exemplo

4. Princípio aplicáveis

4.1. O acessório segue o principal

4.2. A coisa perece para o dono

4.3. Da vedação do enriquecimento sem causa

4.4. O gênero não perece

4.5. O credor de coisa certa não está obrigado a receber coisa diferente

4.6. Da volta ao estado anterior em caso de descumprimento obrigacional

4.7. Da punição ao ato culposo que implica em descumprimento dos deveres primários de prestação

4.8. Da responsabilidade objetiva em caso de teoria do risco ou no caso de violação dos deveres anexos

5. Perda e deterioração da coisa

5.1. A perda da coisa

5.1.1. Noção

5.1.2. Conseqüências

5.1.2.1. Extinguir a obrigação

5.1.2.2. Pagar o equivalente em caso de culpa

5.1.2.3. Indenizar em caso de culpa

5.2. A deterioração da coisa

5.2.1. Noção

5.2.2. Conseqüências

5.2.2.1. Extinguir a obrigação

5.2.2.2. Abater proporcionalmente o preço

5.2.2.3. Pagar o equivalente em caso de culpa

5.2.2.4. Indenizar em caso de culpa

6. O problema da culpa no incumprimento obrigacional

6.1. Noção de culpa (negligência, imprudência e imperícia):

6.2. Espécies de culpa

6.2.1. Culpa na escolha

6.2.2. Culpa na vigia

6.2.3. Culpa recíproca

6.3. Distinção entre incumprimento e mora

6.3.1. Colocação do problema

6.3.2. Critério para distinção: a utilidade da prestação

6.4. Conseqüências pelo incumprimento culposo da obrigação

6.4.1. No caso de perda da coisa

6.4.2. No caso de deterioração

6.5. Conseqüências pelo incumprimento não culposo da obrigação

6.5.1. No caso de perda

6.5.2. No caso de deterioração

7. Descumprimento obrigacional e teoria do risco

7.1. A regra da última parte do § Único do art. 927 do CC: “Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, (...) quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.”

7.2. A regra do art. 931 do CC: “Ressalvados outros casos previstos em lei especial, os empresários individuais e as empresas respondem independentemente de culpa pelos danos causados pelos produtos postos em circulação.”

7.3. Conseqüências pelo incumprimento obrigacional com base na teoria do risco

7.3.1. Incumprimento e fato da coisa (risco à saúde)

7.3.1.1. a reparação integral do dano

7.3.2. Incumprimento e fato da coisa (risco à segurança)

7.3.2.1. a reparação integral do dano

7.3.3. Incumprimento e defeito da coisa

7.3.3.1. a substituição da coisa por outra da mesma espécie, em perfeitas condições de uso

7.3.3.2. a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada

7.3.3.3. o abatimento proporcional do preço

8. Descumprimento obrigacional e violação dos deveres anexos

8.1. Violação dos deveres secundários de prestação e utilidade da prestação

8.2. Violação dos deveres de conduta e utilidade da prestação

9. Orientação jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça

8.1. Obrigação de dar coisa certa:[1]

- A obrigação, assumida pela construtora de um empreendimento imobiliário, de remunerar a proprietária do terreno mediante a dação em pagamento de unidades ideais com área correspondente a 25% do total construído qualifica-se como obrigação de fazer, e não como obrigação de dar coisa certa. Como conseqüência, o inadimplemento dessa obrigação, representado pelo acréscimo de área ao imóvel sem o conhecimento da proprietária e, conseqüentemente, sem que lhe tenha sido feito o correspondente pagamento, dá lugar à incidência dos arts. 461, §1º, do CPC, e 880 e 881, do CC/16, possibilitando a escolha, pelo credor entre requerer o adimplemento específico da obrigação ou a respectiva conversão em perdas e danos.

8.2. Obrigação de dar coisa incerta: [2]

I - A execução para entrega de coisa incerta, após a escolha do bem, segue o rito previsto para a execução de coisa certa(arts. 621 e segs.).

II - O objetivo específico da execução para entrega da coisa é a obtenção do bem que se encontra no patrimônio do devedor (ou de terceiro). Caso não mais seja encontrado o bem, ou no caso de destruição ou alienação, poderá o credor optar pela entrega de quantia em dinheiro equivalente ao valor da coisa e postular a transformação da execução de coisa certa em execução por quantia certa, na linha do art. 627, CPC.

III - Indispensável, nessa hipótese, contudo, a prévia apuração do quantum, por estimativa do credor ou por arbitramento. Sem essa liquidação, fica inviável a conversão automática da execução para entrega da coisa em execução por quantia certa, mormente pelo fato que a execução carecerá de pressuposto específico, a saber, a liquidez.

8.3. A coisa perece para o dono: [3]

...................................................................................................................

RELATÓRIO E DECISÃO Tratam os autos de ação de indenização proposta pelo espólio de MARIA CAVALLIM LOSSO em relação a MARIA DE LOURDES D'OLIVEIRA.

O Tribunal de Justiça do Estado do Paraná negou provimento ao apelo da ré, em acórdão assim ementado: "APELAÇÃO CÍVEL. INDENIZAÇÃO. DANOS MATERIAIS. COMPRA E VENDA DE AUTOMÓVEL. ANÚNCIO ENGANOSO. VÍCIOS OCULTOS. CONDENAÇÃO COM BASE NO CCB/16, ART. 159. NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DE CULPA. DESCONHECIMENTO DA EXISTÊNCIA DOS VÍCIOS PELA VENDEDORA. BOA-FÉ. NULIDADE DA SENTENÇA. ERROR IN JUDICANDO. INOCORRÊNCIA. CULPA CARACTERIZADA NA MODALIDADE IMPRUDÊNCIA. PREVISIBILIDADE. POSSIBILIDADE DE EVITAR O RESULTADO DANOSO. CORREÇÃO MONETÁRIA. IGP-M. ÍNDICE OFICIAL. INEXISTÊNCIA DE OFENSA À LEI 6.899/81, ART. 1º. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO.

Inexiste error in judicando, pois a condenação deu-se com base no CCB/16, art. 159, e o juiz fundamentou o seu convencimento, quanto à existência da culpa.

Comprovada a culpa da apelante, pela imprudência na confecção do anúncio.

O desconhecimento dos vícios não ilide a culpa, mas tão-somente o dolo.

A fixação de índice de correção monetária deve se pautar nos critérios que melhor reflitam a inflação do período, não no menos gravoso ao devedor." Inconformada, a ré interpôs recurso especial, amparado na alínea a do permissivo constitucional, no qual sustentou ofensa aos artigos 1.127, caput, do Código Civil de 1916; 212, inciso I, do atual Código Civil e 335 do Código de Processo Civil.

O recurso foi inadmitido, o que ensejou a interposição do presente agravo de instrumento.

É o relatório.

De início, quanto aos artigos 212, inciso I, do Código Civil e 335 do Código de Processo Civil, apesar de ter apontado, em suas razões recursais, como supostamente violados pelo acórdão guerreado, a recorrente não demonstrou, clara e precisamente, no que consistiu a alegada negativa de vigência à lei, ou mesmo qual a sua correta aplicação.

Diante disso, o conhecimento do recurso especial, quanto a esses dispositivos, encontra óbice do enunciado 284 da Súmula do Supremo Tribunal Federal que se aplica, também, a este Sodalício, por analogia, ao dispor que: "É inadmissível o recurso extraordinário, quando a deficiência na sua fundamentação não permitir a exata compreensão da controvérsia".

Observa-se, também, que o conteúdo normativo desses dispositivos não foi objeto de análise pela decisão impugnada, apesar da oposição de embargos de declaração, não servindo de fundamento à conclusão adotada pelo tribunal local. Desatendido, portanto, o requisito do prequestionamento, nos termos do enunciado 211 da Súmula desta Corte. Ressalte-se que a recorrente sequer apontou violação ao disposto no artigo 535 do Código de Processo Civil.

Quanto ao artigo 1.127, do Código Civil, ao versar sobre o tema restou demonstrado que a procedência do pedido está rigorosamente vinculada ao exame das provas depositadas, conforme pode-se constatar nas razões desenvolvidas no aresto impugnado: "(...) Quanto ao invocado Código Civil de 1916, artigo 1.127, que estabelece que, a partir da tradição, os riscos correm por conta do comprador, é evidentemente inaplicável à espécie, visto que os riscos aos quais se refere a norma dizem respeito à deterioração ou perecimento da coisa que ocorrem posteriormente ao contrato de compra e venda. O artigo expressa o princípio de direito das obrigações, que diz que a coisa perece para o dono. Pois bem, restou cabalmente provado que o perecimento do bem em questão deu-se muito antes da sua aquisição pela apelada, razão pela qual ela não pode arcar com tais prejuízos.

(...)" A convicção a que chegou o acórdão decorreu da análise do conjunto fático-probatório, e o acolhimento da pretensão recursal demandaria o reexame do mencionado suporte, obstando a admissibilidade do especial, à luz do enunciado 7 da Súmula desta Corte.

Posto isso, nego provimento ao agravo.”

8.4. Conseqüências pela deterioração da coisa: [4]

- O que caracteriza o contrato de venda em consignação, também denominado pela doutrina e pelo atual Código Civil (arts. 534 a 537) de contrato estimatório, é que (i) a propriedade da coisa entregue para venda não é transferida ao consignatário e que, após recebida a coisa, o consignatário assume uma obrigação alternativa de restituir a coisa ou pagar o preço dela ao consignante.

- Os riscos são do consignatário, que suporta a perda ou deterioração da coisa, não se exonerando da obrigação de pagar o preço, ainda que a restituição se impossibilite sem culpa sua.

- Se o consignatário vendeu as mercadorias entregues antes da decretação da sua falência e recebeu o dinheiro da venda, inclusive contabilizando-o indevidamente, deve devolver o valor devidamente corrigido ao consignante. Incidência da Súmula n.° 417 do STF.

8.5. Deterioração da coisa sem culpa: [5]

- Não tem incidência a norma prevista no artigo 1.190 do Código Civil, que autoriza ao locatário requerer a redução proporcional do aluguel ou a rescisão do contrato, na hipótese em que a reparação do imóvel deteriorado, objeto da locação, baseou-se em responsabilidade contratual.

- Não agride o art. 1.026 do Código Civil a previsão contratual que impõe ao inquilino a conservação do prédio locado, porquanto as obras a que aludem referida cláusula referem-se à deterioração natural do imóvel, não sendo decorrentes de fato alheio a sua conduta, como no caso do incêndio ocorrido no prédio.

8.6. Coisa alheia e evicção: [6]

CIVIL. EVICÇÃO. O direito de demandar pela evicção não supõe, necessariamente, a perda da coisa por sentença judicial. Hipótese em que, tratando-se de veículo roubado, o adquirente de boa-fé não estava obrigado a resistir à autoridade policial; diante da evidência do ato criminoso, tinha o dever legal de colaborar com as autoridades, devolvendo o produto do crime. Recurso especial não conhecido.

8.7. Perda da coisa e indenização: [7]

- Apenas nas hipóteses em que há a perda da coisa, o seu perecimento ou deterioração, que se aplica a regra do art. 627 do CPC, o que assegura ao credor o direito a receber, além das perdas e danos, o valor da coisa.

- No processo julgado há a retenção do imóvel, em virtude das benfeitorias nele efetuadas pelos adquirentes, além da alegação de serem possuidores de boa-fé, questões passíveis de serem analisadas tão-somente em sede de cognição, com ampla instrução probatória.

8.7. Pagar o equivalente: [8]

PRISÃO CIVIL. DEPOSITARIO JUDICIAL. BENS NÃO ENCONTRADOS. PROPOSTA DE PAGAR O EQUIVALENTE EM DINHEIRO. ILEGALIDADE.

1. PACIFICADA A JURISPRUDENCIA NO SENTIDO DE QUE A PRISÃO DO DEPOSITARIO DISPENSA A INSTAURAÇÃO DA AÇÃO DE DEPOSITO, PODENDO SER EFETIVADA NO PROPRIO PROCESSO EXECUTIVO (STF), SUMULA/619).

2. SE O DEPOSITARIO JUDICIAL, INTIMADO PARA APRESENTAR OS BENS QUE LHE FORAM CONFIADOS, COMPARECE A JUIZO E AFIRMA QUE ESTA IMPOSSIBILITADO DE FAZE-LO DEPOIS QUE O OFICIAL DE JUSTIÇA CERTIFICOU NÃO OS HAVER ENCONTRADO, PROPONDO-SE A DEPOSITAR O EQUIVALENTE EM DINHEIRO, A SUA PRISÃO ENCONTRA OBSTACULO NA CONSTITUIÇÃO.

3. AS DISPOSIÇÕES DO CODIGO DE PROCESSO CIVIL - ARTIGOS 902, I E 904 - NÃO DEVEM LIMITAR-SE APENAS AOS CASOS EM QUE FIQUE COMPROVADO QUE ESTA IMPOSSIBILITADO DE FAZE-LO EM DECORRENCIA DO PERECIMENTO DO BEM.

8.8. Alternatividade de solução para o caso de incumprimento por defeito (deterioração) da coisa: [9]

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IV- EM REGRA, RECEBENDO O COMPRADOR O IMOVEL COM METRAGEM MENOR, PODE ELE EXIGIR A COMPLEMENTAÇÃO DA AREA FALTANTE, A RESOLUÇÃO DO CONTRATO OU O ABATIMENTO DO PREÇO, UTILIZANDO A AÇÃO EX EMPTO. EM SE TRATANDO, TODAVIA, DE DIFERENÇA DE METRAGEM DE VAGA DE GARAGEM, PODE O COMPRADOR, EM RAZÃO DE ESTAR IRREGULAR SOMENTE UMA PARTE FISICAMENTE DISTINTA DO TODO (UNIDADE HABITACIONAL), PLEITEAR INDENIZAÇÃO PELA DESVALORIZAÇÃO DO IMOVEL.

V- O PRAZO PRESCRICIONAL DE SEIS MESES DEFINIDO NO ART. 178, PAR. 5., IV DO CODIGO CIVIL DIZ RESPEITO AS AÇÕES POR VICIO DE QUALIDADE (VICIO REDIBITORIO), E, NÃO, POR VICIO DE QUANTIDADE (DIFERENÇA DE AREA).

VI- CONTENDO A PETIÇÃO INICIAL RELATO SOBRE OS FATOS E INDICAÇÃO DA CAUSA DE PEDIR E DO PEDIDO, HAVENDO CORRELAÇÃO LOGICA ENTRE ELES, NÃO HA QUE SE COGITAR DE SUA INEPCIA.

VII- A PRODUÇÃO DE PROVAS CONSTITUI DIREITO SUBJETIVO DA PARTE, A COMPORTAR TEMPERAMENTO A CRITERIO DA PRUDENTE DISCRIÇÃO DO MAGISTRADO QUE PRESIDE O FEITO, COM BASE EM FUNDAMENTADO JUIZO DE VALOR ACERCA DE SUA UTILIDADE E NECESSIDADE, DE MODO A RESULTAR A OPERAÇÃO NO EQUILIBRIO ENTRE A CELERIDADE DESEJAVEL E A SEGURANÇA INDISPENSAVEL NA REALIZAÇÃO DA JUSTIÇA.

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IX- A TRANSAÇÃO SOMENTE AFETA OS DIREITOS DISPONIVEIS DE CADA CONDOMINO, NÃO ATINGINDO DIREITOS COMUNS, COMO AQUELES RELACIONADOS COM OS DEFEITOS DE CONSTRUÇÃO. ESSES DIREITOS PERTENCEM A TODOS, INCLUSIVE AO CONDOMINIO, E SOMENTE PODEM SER OBJETO DE TRANSAÇÃO SE APROVADOS PELA UNANIMIDADE DOS CONDOMINIOS.

X- EVENTUAL INEXISTENCIA DE COAÇÃO, BEM COMO A ILEGALIDADE DA INDENIZAÇÃO POR SER SUPERIOR AO PREJUIZO, NÃO PODEM SER ANALISADAS EM RECURSO ESPECIAL, NOS TERMOS DO VERBETE N. 7 DA SUMULA/STJ, UMA VEZ QUE SERIA DE RIGOR A APRECIAÇÃO DA PROVA PRODUZIDA.

8.9. Teoria do risco e caso fortuito interno:[10]

Direito processual civil e do consumidor. Recurso especial. Roubo de talonário de cheques durante transporte. Empresa terceirizada. Uso indevido dos cheques por terceiros posteriormente. Inscrição do correntista nos registros de proteção ao crédito. Responsabilidade do banco. Teoria do risco profissional. Excludentes da responsabilidade do fornecedor de serviços. art. 14, § 3º, do CDC. Ônus da prova.

- Segundo a doutrina e a jurisprudência do STJ, o fato de terceiro só atua como excludente da responsabilidade quando tal fato for inevitável e imprevisível.

- O roubo do talonário de cheques durante o transporte por empresa contratada pelo banco não constituiu causa excludente da sua responsabilidade, pois trata-se de caso fortuito interno.

- Se o banco envia talões de cheques para seus clientes, por intermédio de empresa terceirizada, deve assumir todos os riscos com tal atividade.

- O ônus da prova das excludentes da responsabilidade do fornecedor de serviços, previstas no art. 14, § 3º, do CDC, é do fornecedor, por força do art. 12, § 3º, também do CDC.

8.10. Obrigação de dar coisa incerta: [11]

Trata-se de agravo de instrumento interposto contra decisão denegatória de seguimento a recurso especial fundado na alínea "a" do permissivo constitucional, em que se alega ofensa aos artigos 36 da Lei n.º 6.404/76; 50 e 1.069 do Código Civil.

Insurge-se contra acórdão assim ementado (fl. 143): "AÇÃO COMINATÓRIA. Cumprimento de obrigação de entrega de laranjas para produção de suco. Empresa industrial de que participa o réu na condição de acionista. Tutela antecipada concedida.

Inadmissibilidade. Direito subjetivo não aparente. Obrigação de dar coisas incertas ou infungíveis. Alienação já consumada, ademais, da posição contratual na venda e compra e de ações da companhia.

Negócios jurídicos não subordinados à venda conjunta do imóvel onde os cedentes cultivam as frutas. Provimento ao recurso. Não incidência do art. 461, § 3º, do CPC. Voto vencido. Não é caso de tutela provisória, ou antecipada, em ação cominatória, na qual companhia exige de acionista, que já cedeu ações e a posição contratual em venda e compra de frutas, a entrega destas, sob fundamento de que as cessões estariam subordinadas à venda conjunta do imóvel onde as cultiva." Sustenta a empresa recorrente que não é possível ao acionista-vendedor ceder o contrato de compra e venda de frutas a terceiro sem a sua anuência e, ainda, que é lícito, por avença, emprestar caráter de infungibilidade a determinados bens fungíveis.

Inviável, porém, o recurso.

A pretensão recursal demanda interpretação de cláusulas do contrato entabulado entre as partes e reexame do conteúdo probatório coligido aos autos, o que é vedado pelas Súmulas 5 e 7 desta Corte.

Ante o exposto, nego provimento ao agravo de instrumento.

8.11. Venda de coisa futura: [12]

PROCESSO CIVIL. EXECUÇÃO PARA ENTREGA DE COISA FUNGÍVEL EM DATA CERTA E FUTURA. SACAS DE CAFÉ. VENCIMENTO DA DÍVIDA. TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL. ARTS. 585, II, E 621, CPC. RECURSO PROVIDO.

I - A redação dada aos arts. 585, II, e 621, CPC, pela Lei 8.953/94, ampliou o rol dos títulos executivos, extrajudiciais.

II - Admissível perante o nosso direito a execução fundada em contrato que registre a obrigação de entregar coisa fungível, em data determinada, sem necessidade de prévio processo de conhecimento, bastando que o instrumento contenha os requisitos da exigibilidade, certeza e liquidez, sendo que, no ponto, tal possibilidade já era possível antes mesmo da "Reforma" em curso (precedente: REsp 52.052-RS).

III - O acórdão que examina todos os pontos suscitados, sem incorrer nos vícios de omissão, contradição e obscuridade, não viola o art. 535, CPC.

8.12. Venda da esperança e da coisa esperada: [13]

Direito Civil. Direito Processual Civil. Rescisão contratual. Perdas e danos. Liquidação por arbitramento. Exportação de suco de laranja. Cotação em bolsa de valores a ser considerada. Simples interpretação de cláusulas contratuais.

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A agravante ajuizou ação pelo rito ordinário com o fim de rescindir contratos de compra e venda e transformação de laranjas em suco para exportação, bem como haver indenização da parte ora agravada.

Concluiu o juiz que a culpa pela rescisão não era da agravada, mas da requerente. Por isso, julgou improcedente o pedido. A sentença, todavia, foi reformada pelo Primeiro Tribunal de Alçada Civil de São Paulo. A agravada, considerada responsável pela rescisão, foi condenada a arcar com as perdas e danos, cujo montante deveria ser apurado “em perícia a ser realizada em execução de sentença, levando-se em conta o prejuízo decorrente de eventual perda de frutas recusadas, e os lucros cessantes serão apurados no cotejo entre o lucro obtido na comercialização das safras futuras, até a safra 1991/1992, inclusive, e o lucro que seria auferido se mantidos e cumpridos todos os contratos” (fl. 78).

Em liquidação, concluiu o juiz: “O v. acórdão estabeleceu o pagamento da indenização do valor equivalente àquilo que receberia a autora com a venda da safra, se o contrato tivesse sido cumprido (fls. 1099).

Ora! Na cláusula 4.3 dos contratos impressos usados na comercialização de suco de laranja pela autora (fls. 405 a 517), estabeleceu-se que a cotação do produto a ser exportado seria feita pela média aritmética das cotações diárias na Bolsa de Mercadorias de Nova Iorque.

Esse mesmo critério ficou também fixado na cláusula 3.2.6 do contrato objeto desta ação (fls. 42).

(...) Assim, embora a perícia tenha esclarecido que a autora vinha exportando a maioria de sua produção a países da Europa, onde o produto em questão alcança preços significativamente maiores, a indenização há de ser baseada no critério ajustado no contrato e que já vinha sendo utilizado pela autora, a qual, por algum motivo, resolveu naquela época desprezar os preços mais avantajados vigentes no mercado europeu, preferindo eleger contratualmente os preços obtidos no mercado norte-americano” (fl. 108).

E, em embargos de declaração, esclareceu que: “a) a data de conversão referida na sentença é a do efetivo pagamento; b) o volume de produção a ser considerado é o real, constatado originalmente pela perícia oficial e não o previsto no contrato; c) a taxa de rendimento a ser considerada é de 252 caixas de laranja para cada tonelada de suco” (fl. 110).

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Afirma-se que, para o cálculo do que devido pelas perdas e danos, deveria ter sido considerada a cotação do mercado europeu, pois neste é que seria comercializado o produto. A própria agravante observa que “a indenização deveria ser aquela a ser apurada como se o contrato tivesse sido efetivamente cumprido” (fl. 152, o destaque é do original).

Ocorre que, do que consta dos autos, as partes estipularam no contrato que a cotação seria a da bolsa de Nova Iorque, não obstante a comercialização dos produtos na Europa. Já na sentença de liquidação, mantida pelo acórdão recorrido nessa parte, ressaltou-se que no contrato “estabeleceu-se que a cotação do produto a ser exportado seria feita pela média aritmética das cotações diárias na Bolsa de Mercadorias de Nova Iorque” (fl. 108).

Assim sendo, se o contrato tivesse sido cumprido, os índices da Bolsa de Nova Iorque teriam sido utilizados. Concluir de forma diversa impõe nova interpretação das cláusulas contratuais examinadas pelo Tribunal a quo, o que não pode ser feito em recurso especial, segundo o enunciado da Súmula n.º 5 desta Corte.

Também não escapa à incidência da referida súmula a questão referente à produção a ser considerada para o cálculo da indenização, se a real ou a presumida. Da leitura do contrato, concluiu o Tribunal a quo que os valores a serem considerados ligavam-se à produção efetiva, não à esperada.

E, também nesse aspecto, o acórdão recorrido não desrespeita os limites do que decidido na decisão exeqüenda. Esta apenas determinou que os lucros cessantes “serão apurados no cotejo entre o lucro obtido na comercialização das safras futuras, até a safra 1991/1992, inclusive, e o lucro que seria auferido se mantidos e cumpridos todos os contratos” (fl. 78). Tal não impede a solução adotada no aresto atacado.

Posto isso, nego provimento ao agravo.

8.13. Venda de coisa alheia: [14]

ÇÃO RESCISÓRIA. Ação reivindicatória. Venda a non domino.

A ineficácia pode ser alegada pelo réu da ação reivindicatória (art.

622 do CCivil).

8.14. Resolução da obrigação por culpa:[15]

CIVIL. CONTRATO. COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. RESOLUÇÃO POR CULPA DA CONSTRUTORA. ARTIGO 924, DO CÓDIGO CIVIL/1916. INAPLICABILIDADE. APLICAÇÃO DO ART. 1.092, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CÓDIGO CIVIL/1916. RESTITUIÇÃO DA INTEGRALIDADE DAS PARCELAS PAGAS E DOS LUCROS CESSANTES PELO VALOR DO ALUGUEL MENSAL QUE IMÓVEL PODERIA TER RENDIDO. PRECEDENTES.

- Na resolução de compromisso de compra e venda de imóvel, por culpa do promitente-vendedor, não é aplicável o disposto no art. 924 do Código Civil/1916, mas sim o parágrafo único do art. 1.092 do Código Civil/1916, e, conseqüentemente, está o promitente-vendedor obrigado a devolver integralmente a quantia paga pelo promitente-comprador.

- Resolvida a relação obrigacional por culpa do promitente vendedor que não cumpriu a sua obrigação, as partes envolvidas deverão retornar ao estágio anterior à concretização do negócio, devolvendo-se ao promitente vendedor faltoso o direito de livremente dispor do imóvel, cabendo ao promitente-comprador o reembolso da integralidade das parcelas já pagas, acrescida dos lucros cessantes.

- A inexecução do contrato pelo promitente-vendedor, que não entrega o imóvel na data estipulada, causa, além do dano emergente, figurado nos valores das parcelas pagas pelo promitente-comprador, lucros cessantes a título de alugueres que poderia o imóvel ter rendido se tivesse sido entregue na data contratada. Trata-se de situação que, vinda da experiência comum, não necessita de prova (art. 335 do Código de Processo Civil).

8.15. Culpa recíproca: [16]

RECURSO ESPECIAL - ALÍNEAS "A" E "C" - RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO - ATO OMISSIVO - RESPONSABILIDADE SUBJETIVA - NEGLIGÊNCIA NA SEGURANÇA DE BALNEÁRIO PÚBLICO - MERGULHO EM LOCAL PERIGOSO - CONSEQÜENTE TETRAPLEGIA - IMPRUDÊNCIA DA VÍTIMA - CULPA RECÍPROCA - INDENIZAÇÃO DEVIDA PROPORCIONALMENTE.

O infortúnio ocorreu quando o recorrente, aos 14 anos, após penetrar, por meio de pagamento de ingresso, em balneário público, mergulhou de cabeça em ribeirão de águas rasas, o que lhe causou lesão medular cervical irreversível.

Para a responsabilização subjetiva do Estado por ato omissivo, “é necessário, que o Estado haja incorrido em ilicitude, por não ter acorrido para impedir o dano ou por haver sido insuficiente neste mister, em razão de comportamento inferior ao padrão legal exigível” (Celso Antônio Bandeira de Mello, "Curso de Direito Administrativo", Malheiros Editores, São Paulo, 2002, p. 855).

Ao mesmo tempo em que se exige da vítima, em tais circunstâncias, prudência e discernimento - já que pelo senso comum não se deve mergulhar em local desconhecido -, imperioso reconhecer, também, que, ao franquear a entrada de visitantes em balneário público, sejam eles menores ou não, deve o Estado proporcionar satisfatórias condições de segurança, mormente nos finais de semana, quando, certamente, a freqüência ao local é mais intensa e aumenta a possibilidade de acidentes.

"Não há resposta a priori quanto ao que seria o padrão normal tipificador da obrigação a que estaria legalmente adstrito. Cabe indicar, no entanto, que a normalidade da eficiência há de ser apurada em função do meio social, do estágio de desenvolvimento tecnológico, cultural, econômico e da conjuntura da época, isto é, das possibilidades reais médias dentro do ambiente em que se produziu o fato danoso” (Celso Antônio Bandeira de Mello, op. cit., loc. cit.).

Há, na hipótese dos autos, cuidados que, se observados por parte da Administração Pública Estadual, em atuação diligente, poderiam ter evitado a lesão. A simples presença de salva-vidas em locais de banho e lazer movimentados é exigência indispensável e, no particular, poderia ter coibido a conduta da vítima. Nem se diga quanto à necessidade de isolamento das zonas de maior risco, por exemplo, por meio de grades de madeira, cordas, corrimãos etc.

Em passeios dessa natureza, amplamente difundidos nos dias atuais sob a denominação de “turismo ecológico”, não somente para as crianças, como para jovens e adultos, é de se esperar, conforme as circunstâncias peculiares do local, a presença de cabos de isolamento e a orientação permanente de guias turísticos e funcionários que conheçam o ambiente visitado.

Segundo a lição do notável Aguiar Dias, doutrinador de escol no campo da responsabilidade civil, “a culpa da vítima, quando concorre para a produção do dano, influi na indenização, contribuindo para a repartição proporcional dos prejuízos” (in “Da responsabilidade civil”, Forense, Rio de Janeiro, 1960, Tomo II, p. 727).

Recurso especial provido em parte para reconhecer a culpa recíproca e, como tal, o rateio das verbas condenatórias e das despesas e custas processuais meio a meio, arcando cada parte com a verba honorária advocatícia do respectivo patrono.



[1] REsp 598.233/RS, Rel. Ministro ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO, Rel. p/ Acórdão Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 02.08.2005, DJ 29.08.2005 p. 332

[2] REsp 327.650/MS, Rel. Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, QUARTA TURMA, julgado em 26.08.2003, DJ 06.10.2003 p. 273

[3] AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 775.133 - PR (2006/0104778-7) RELATOR : MINISTRO CASTRO FILHO.

[4] (REsp 710.658/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 06.09.2005, DJ 26.09.2005 p. 373)

[5] REsp 85.929/SP, Rel. Ministro VICENTE LEAL, SEXTA TURMA, julgado em 28.06.2001, DJ 20.08.2001 p. 542.

[6] REsp 69.496/SP, Rel. Ministro ARI PARGENDLER, TERCEIRA TURMA, julgado em 09.12.1999, DJ 07.02.2000 p. 149.

[7] REsp 720.061/GO, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 14.11.2006, DJ 18.12.2006 p. 371.

[8] RHC 3.016/DF, Rel. Ministro JESUS COSTA LIMA, QUINTA TURMA, julgado em 29.09.1993, DJ 18.10.1993 p. 21882

[9] REsp 83.751/SP, Rel. MIN. SALVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA.

[10] REsp 685.662/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI.

[11] AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 517.356 – SP, Rel. MINISTRO ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO

[12] REsp 188.328/ES, Rel. Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, QUARTA TURMA, julgado em 15.02.2000, DJ 27.03.2000 p. 110

[13] AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 376.259 - SP (2001/0032237-9) RELATOR : MINISTRO ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO

[14] REsp 94.270/SC, Rel. Ministro CESAR ASFOR ROCHA.

[15] REsp 644.984/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI.

[16] REsp 418.713/SP, Rel. Ministro FRANCIULLI NETTO.

Canal de comunicação entre o Professor e os alunos da disciplina Direito das Obrigações, período 2008.1, da Universidade Federal do Piauí.

Contato: efrencordao2008@gmail.com

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Professor de direito civil e direito do consumidor da UFPI. Advogado.